
Daí começam as piadas e os comentários tão previsíveis quanto o próprio cantor: ele não produz nada de novo há anos, ele está decadente, os especiais são todos iguais, e claro, não poderia faltar a inevitável comparação de Roberto com o panetone, afinal, ambos só aparecem no Natal e na Páscoa...
Ok, todos estão certos, ele foi (quase) sempre um xarope e ninguém o agüenta de uns anos pra cá. Mas isso é chover no molhado. Estou aqui para dizer com todas as letras o seguinte: sou fã do Roberto. Pronto, falei.
Reparem que não usei aspas quando me referi a ele como Rei. Dispensei qualquer ironia, sabem por quê? Porque de alguma forma esse título faz sentido. E não é só pelos recordes de vendas e o marketing avassalador que cerca o cantor ao longo de seus 48 anos de carreira. Basta ouvir com sensibilidade e um pingo de honestidade – essa é a palavra – a sua produção mais criativa, que vai de 1965 até, mais ou menos, 1976. Não há nada parecido na música pop do Brasil. Digo música pop porque o termo MPB surgiu no final dos anos sessenta carregado de preconceito. Era uma maneira de separar a “boa música”, feita por uma elite intelectual e nacionalista, da música jovem e alienada que vinha do exterior em forma de guitarras e histeria. Até hoje é um pouco assim, apesar da decisiva intervenção tropicalista. Naquele momento, portanto, o oposto de MPB era Jovem Guarda e Roberto Carlos.
Não quero entrar na história do movimento, discutir seus defeitos, qualidades e influências (ô teminha polêmico!), mas imagine uma seqüência musical com É Proibido Fumar, Negro Gato, Eu Sou Terrível e Você Não Serve Pra Mim. A festa está pronta. É irresistível!


Além de afinadíssimo, o cantor desenvolveu um fraseado impressionante. Ouçam, por exemplo, a gravação original de Sua Estupidez, de 1969. O ritmo, a respiração, o tempo que ele entra nos versos, nada é convencional. O mesmo acontece em As Curvas da Estrada de Santos. Isso pra não falar das letras inspiradíssimas, simples e profundas. Roberto e Erasmo estavam compondo como nunca. Não à toa essas canções foram gravadas na mesma época por Gal Costa e Elis Regina respectivamente. São ainda desse período as memoráveis As Canções que Você Fez pra Mim, As Flores Do Jardim Da Nossa Casa, Detalhes, Como Dois e Dois (presente de Caetano), Debaixo Dos Caracóis Dos Seus Cabelos (a retribuição), Todos Estão Surdos, e mais, muito mais.
E Roberto, quem diria, fez até música sobre maconha (!!!) com Erasmo. Ela se chama Maria Joana (pescou o trocadilho infame?) e está no indispensável Carlos, Erasmo, de 1971.
Depois desse período, Roberto foi perdendo o rumo. As boas canções eram cada vez mais raras. Continuou vendendo horrores – o auge foi o álbum Roberto Carlos, de 1981, com três milhões de cópias incluindo o mega-sucesso Emoções - e firmando a imagem cafona de latin lover. Passou por fases constrangedoras. Teve a “defesa da Amazônia”, as homenagens às “mulheres comuns” (gordinhas, baixinhas, quatro-olhos...) e até funk com Mc Leozinho no ano passado. Sem falar da intensificação das canções religiosas, MUITO diferentes da pulsante Todos Estão Surdos, de 1971. Foi o fundo do poço.
Numa recém-divulgada lista (ó, listas!) dos 100 maiores discos da música brasileira feita pela Rolling Stone, Roberto aparece com quatro álbuns. Não é pouco considerando a concorrência. São eles Jovem Guarda (1965), Em Ritmo de Aventura (1967), O Inimitável (1968) e Roberto Carlos (1971). Eu ainda acrescentaria o RC de 1969.
O jornalista Pedro Alexandre Sanches, autor dos livros Tropicália – a decadência bonita do samba e Como dois e dois são cinco – Roberto Carlos (& Erasmo & Wanderléa), diz uma coisa que concordo mais a cada dia: “Erasmo e Roberto são a espinha dorsal da música popular brasileira, de toda e qualquer música brasileira”.
Vale pensar (e ouvir), concordando ou não.
E claro, assistirei ao Especial apesar dos pesares.
8 comentários:
Otimo texto. Sugiro encaminhar ao site www.clubedorei.com
uaaaauuu!!
show, ph!
tá até sendo convidado a publicar em outro site!Olha lá,hein? Não vai virar estrela e abandornar os velhos amigos!
beijos
Texto excelente! Parabéns!
Amor, muito bom o texto, viu? Tô com preguiça de ler, mas nem preciso visto que vc acabou de ler pra mim no tel - tô até falando com vc!! =D
E tenho que reforçar: nesta 1ª foto, o Roberto tá muito cuecão de couro hein!! =p
Pois é, mas até que nossos passeios de carro são agradáveis ao som de Roberto - embora eu ache que eu sou a responsável por esse ar agradável!!! ;)
Beijooo!!
P.s.: Pronto, agora vc pode parar de reclamar que eu não posto aqui. Vou voltar a fazer minhas colas pra prova de amanhã!! Hahahahah!! =p
Quero comunicar que textos do Canteiro Cabul são de uso exclusivo do blog, não podendo ser vendidos, doados ou encaminhados para qualquer outro site. hehehe. Muito bom, PH.
Sobre o Roberto, ele é fodão. Mas fodaço mesmo é o Erasmo. E tenho dito.
aeee PH!!!! arrebentando!!!
mas serio...vc consegue assistir ao especial??? ehehehe
Pedro, você foi ótimo. Sabe, minha opinião é que naqueles tempos quando a onda intelectual era curtir tropicália e ser de alguma forma subversivo, havia também um lance de preconceito ao romantismo e de alguma forma ao amor. Os homens, na verdade, morriam de ciúme, inveja ou qualuer sentimento que o valha do Rei RC.As piadinhas eram relacionadas sobretudo a sexualidade de Roberto Carlos, tudo para atingir a mulher namorada ou esposa. É que naverdade, Roberto Carlos ao cantar dizia coisas que os machões das décadas de 60 e 70 não diziam às suas companheiras. E ele(RC) dizia com palavras doces, românticas e carregadas e carinho. Então... a mulherada era apaixonada pelo rapaz que cantava em versos a "namoradinha de um amigo meu" ou ainda mais tarde sem poder esquecer "velhos costumes".
Valeu, Pedro!
Walter Farnezi
Jornalista
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